Em paz num amanhecer

06 dezembro, 2012
O ano já está perto de terminar, o planeta vai completar sua órbita como sempre. É final de primavera no hemisfério sul. O dia amanhece num céu azul enfeitado com nuvens branquinhas, umas aqui, outras ali. De onde estou, fico encantada olhando suas formações que a brisa dessa manhã logo se encarrega de desmanchar. Passarinhos pousam cantando na varanda, o resto é silêncio.

Houve um tempo em que os dias pareciam mais longos que agora. Hoje, por mais que a gente se organize, 24 horas são insuficientes para as tarefas de cada jornada. Descansamos pouco, acordamos ainda com sono, nos agitamos o dia todo, de repente é noite novamente, e exaustos nos damos conta do quanto deixamos de cumprir. O que ficou em falta vai se acumulando numa lista enorme que nunca conseguirmos zerar. Pior, vamos passando batido por tudo, sempre na superficialidade, sempre sem tempo.
Tensão, angústia, ansiedade, consequências desse descompasso. E eu me pergunto a razão de vivermos desse jeito insensato... Será mesmo pelo pão nosso de cada dia, cada vez mais difícil de conseguir, ou nos tornamos incompetentes para administar a vida? As duas coisas, talvez.

Se pensarmos que antes, num passado próximo, tínhamos tempo de sobra, mesmo sem as facilidades tecnológicas que agora nos poupam de muitas tarefas e nos permitem resolver quase tudo numa tela de computador ou celular, veremos o tamanho do caos onde nos metemos.
Por que não nos sobra tempo ao invés de faltar?! Qual o sentido desse tipo de vida?!

Acho que vem daí eu gostar tanto das silenciosas madrugadas, as horas calmas do meu pensar. São elas que me fazem estar em paz neste amanhecer.
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Elis Regina - in memoriam

19 janeiro, 2012
Trinta anos passaram. Elis morreu em 19 de janeiro de 1982, sem despedidas, sem nem sabermos porque partiu.

Lembrando dela, lembrei também de um poema de Drummond, escrito para seu grande amigo Pedro Nava que se suicidou sem deixar uma linha sequer sobre a motivação do ato extremo. O poema se intitula A um ausente, e transcrevo aqui apenas os versos que expressam meus sentimentos sobre a partida de Elis.



Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu...

... o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.


Não creio na vida após a morte, e uma das poucas passagens bíblicas de algum significado para mim está em Genesis 3:1:9: No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás.

Somos poeira cósmica e a ela retornaremos um dia, isso é tudo em que acredito. Fica de nós a obra realizada, até que o último que se lembre esteja vivo. Por isso, Elis permanecerá por muito tempo ainda.

Música que amo de paixão, e que têm em Elis a sua mais perfeita intérprete.


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